Por Franco Maciel
O
banho no Mundaú era um dos passatempos preferidos da juventude
palmarina. Alguns, inclusive, se aventuravam e pulavam do alto da ponte
que unia a rua das pedreiras e a Fazenda Jurema, mas minha mãe não
deixava. Ela dizia que eu podia bater a cabeça nas pedras do rio.
- Não vá pular da ponte, viu? Teve um menino que pulou da ponte, bateu a cabeça em uma das pedras do rio e morreu na hora. - disse minha mãe a primeira vez que eu fui tomar banho no rio sem a sua companhia.
Aviso que nunca mais esqueci. Realmente o rio mundaú tinha muitas pedras.
- Quem quer ingá? - perguntou Juca, com a mão cheia dos frutos de uma das ingazeiras que ficavam às margens do rio.
- Eu quero!!! - disse Tiago ao pegar um das mãos de Juca.
- Esse tá doce, viu? Pega um Moisés. - disse Juca mostrando o fruto nas mãos.
Nesse momento, avistei o Ciço, um senhor de idade que trabalhava para o prefeito de União, Antenor Uchôa. Como, na época, não se tinha água encanada, todos da cidade tinham que tomar banho no Mundaú, mas o prefeito preferia tomar banho em sua casa e Ciço era quem ficava com a responsabilidade de pegar água no rio para o seu banho.
Ciço estava com um carro de mão cheio de baldes, acompanhado de sua neta Doralice... a Dora. Menina mais linda em União não existia.
- Senta ali pra o lado de lá, Dora. - disse Ciço ao ver que a gente tomava banho.
Dora sentou de costas pra o rio, mas me parecia que estava com uma imensa vontade de saber o que a gente estava fazendo.
- Vamos pular da ponte? - perguntou Tiago.
- Vou não, mãe não deixa. - disse.
- Ave, Moisés. Vamos!!! Ela nem vai saber!!! - retrucou, Tiago.
- Vou nada!!! - disse
- Pois eu vou... bora, Juca? - perguntou ele ao Juca.
- Bora!!! - respondeu Juca.
Os dois, então, correram pra cima da ponte.
Minha mãe dizia que Tiago era filho de chocadeira... não respeitava o que a mãe dizia.
- Menino sem dono!!! - dizia ela.
Ele era o meu melhor amigo. Gostava de ouvir suas aventuras. Ele, apesar de jovem, conhecia União como a palma da mão. Era afilhado de Correia de Oliveira, advogado de muito prestígio em União dos Palmares, que tratava Tiago a pão de ló.
- Vou pular, Moisés!!! Fica olhando!!! - gritou Tiago.
Tiago correu e pulou de cima da ponte, caindo dentro do rio. Em seguida, Juca fez o mesmo.
- Quem pulou melhor? - perguntou, Juca, ao voltar do mergulho.
- O teu foi melhor!!! - gritei.
- Cadê o Tiago? - perguntou, Juca.
- Ele ainda não voltou. - respondi.
- Tiago, cadê tu??? - gritou Juca.
- Tô aqui!!! - gritou ele de cima da ponte.
- Como é que tu foi parar aí? - perguntei.
- Sou mágico!!! - gritou de cima da ponte. - Lá vou eu de novo!!! - disse.
- Vai pra onde??? - perguntou uma mulher que passava pela ponte.
Era a mãe de Tiago. Ela trabalhava pra Basiliano Sarmento, o "deus" todo poderoso de nossa cidade, o homem que mandava prender e mandava soltar.
- Você vai é pra casa, seu menino maluvido. - disse ela pegando na orelha de Tiago.
- Eita, mãe! Na frente dos meninos, não!!! - disse ele.
- Na frente, atrás... mais menino. - disse ela puxando ele pela orelha.
- Tchau, Tiago. - disse Juca rindo da forma que o amigo tava indo pra casa.
Percebi que Dora também ria de Tiago.
- Vamos, Dora. - disse Ciço que havia acabado de encher os baldes com água e colocado no carro de mão.
Dora se levantou e saiu, sem olhar pra trás, em direção à subida da rua das pedreiras.
- Bora pegar manga, na Jurema? - perguntou, Juca.
- Melhor não... minha mãe disse pra eu ir pra casa logo cedo, porque ela quer que eu vá pra missa hoje. - respondi.
- É mesmo! Tinha esquecido. Minha vó também disse que eu tinha que ir. - disse, Juca.
- Bora, então!!! - disse.
O Juca morava com a vó em um casebre no Jatobá. Estudava com ele no Rocha. Um menino muito pobre, mas muito educado e respeitador. Sua mãe havia morrido durante o seu parto e o pai vivia bêbado pelas ruas de União. Vez ou outra encontrávamos com ele e Juca sempre o tratou muito bem, apesar de não receber nenhum carinho da parte do pai.
Eu morava na rua do comércio, próximo à praça da matriz. Quando cheguei em casa, encontrei minha mãe conversando com dona Aura na porta. Dona Aura era uma velhinha, mas tão velhinha que Tiago dizia que ela havia ajudado Domingos Jorge Velho na destruição do quilombo dos Palmares. Ela ficava enfezada com isso.
- Tava onde, mocinho? - perguntou minha mãe.
- Tava no rio, mãe! - respondi.
- Percebe-se. Nem pense em entrar agora pra não molhar a casa. Fiquei aí secando, enquanto eu converso com dona Aura. - disse minha mãe.
- Dizem que ele corre bixo, Maria. Hoje é noite de lua cheia. Acho que hoje a noite ele vira. - disse dona Aura.
Fiquei curioso pra saber quem era, mas minha mãe ao perceber que eu escutava a conversa mudou logo de assunto.
- A senhora vai pra missa, hoje, dona Aura? - perguntou minha mãe tentando mudar de assunto.
- Vou sim, Maria. Hoje, Padre Clóvis disse que tem uma surpresa. - disse dona Aura.
- Surpresa? - perguntou minha mãe.
- Sim... ele somente disse que a nossa cidade vai entrar na rota do império. - disse dona Aura.
- Rota do Império??? - perguntou minha mãe.
Rota do Império? O que será que Padre Clóvis quis dizer isso?
- Não vá pular da ponte, viu? Teve um menino que pulou da ponte, bateu a cabeça em uma das pedras do rio e morreu na hora. - disse minha mãe a primeira vez que eu fui tomar banho no rio sem a sua companhia.
Aviso que nunca mais esqueci. Realmente o rio mundaú tinha muitas pedras.
- Quem quer ingá? - perguntou Juca, com a mão cheia dos frutos de uma das ingazeiras que ficavam às margens do rio.
- Eu quero!!! - disse Tiago ao pegar um das mãos de Juca.
- Esse tá doce, viu? Pega um Moisés. - disse Juca mostrando o fruto nas mãos.
Nesse momento, avistei o Ciço, um senhor de idade que trabalhava para o prefeito de União, Antenor Uchôa. Como, na época, não se tinha água encanada, todos da cidade tinham que tomar banho no Mundaú, mas o prefeito preferia tomar banho em sua casa e Ciço era quem ficava com a responsabilidade de pegar água no rio para o seu banho.
Ciço estava com um carro de mão cheio de baldes, acompanhado de sua neta Doralice... a Dora. Menina mais linda em União não existia.
- Senta ali pra o lado de lá, Dora. - disse Ciço ao ver que a gente tomava banho.
Dora sentou de costas pra o rio, mas me parecia que estava com uma imensa vontade de saber o que a gente estava fazendo.
- Vamos pular da ponte? - perguntou Tiago.
- Vou não, mãe não deixa. - disse.
- Ave, Moisés. Vamos!!! Ela nem vai saber!!! - retrucou, Tiago.
- Vou nada!!! - disse
- Pois eu vou... bora, Juca? - perguntou ele ao Juca.
- Bora!!! - respondeu Juca.
Os dois, então, correram pra cima da ponte.
Minha mãe dizia que Tiago era filho de chocadeira... não respeitava o que a mãe dizia.
- Menino sem dono!!! - dizia ela.
Ele era o meu melhor amigo. Gostava de ouvir suas aventuras. Ele, apesar de jovem, conhecia União como a palma da mão. Era afilhado de Correia de Oliveira, advogado de muito prestígio em União dos Palmares, que tratava Tiago a pão de ló.
- Vou pular, Moisés!!! Fica olhando!!! - gritou Tiago.
Tiago correu e pulou de cima da ponte, caindo dentro do rio. Em seguida, Juca fez o mesmo.
- Quem pulou melhor? - perguntou, Juca, ao voltar do mergulho.
- O teu foi melhor!!! - gritei.
- Cadê o Tiago? - perguntou, Juca.
- Ele ainda não voltou. - respondi.
- Tiago, cadê tu??? - gritou Juca.
- Tô aqui!!! - gritou ele de cima da ponte.
- Como é que tu foi parar aí? - perguntei.
- Sou mágico!!! - gritou de cima da ponte. - Lá vou eu de novo!!! - disse.
- Vai pra onde??? - perguntou uma mulher que passava pela ponte.
Era a mãe de Tiago. Ela trabalhava pra Basiliano Sarmento, o "deus" todo poderoso de nossa cidade, o homem que mandava prender e mandava soltar.
- Você vai é pra casa, seu menino maluvido. - disse ela pegando na orelha de Tiago.
- Eita, mãe! Na frente dos meninos, não!!! - disse ele.
- Na frente, atrás... mais menino. - disse ela puxando ele pela orelha.
- Tchau, Tiago. - disse Juca rindo da forma que o amigo tava indo pra casa.
Percebi que Dora também ria de Tiago.
- Vamos, Dora. - disse Ciço que havia acabado de encher os baldes com água e colocado no carro de mão.
Dora se levantou e saiu, sem olhar pra trás, em direção à subida da rua das pedreiras.
- Bora pegar manga, na Jurema? - perguntou, Juca.
- Melhor não... minha mãe disse pra eu ir pra casa logo cedo, porque ela quer que eu vá pra missa hoje. - respondi.
- É mesmo! Tinha esquecido. Minha vó também disse que eu tinha que ir. - disse, Juca.
- Bora, então!!! - disse.
O Juca morava com a vó em um casebre no Jatobá. Estudava com ele no Rocha. Um menino muito pobre, mas muito educado e respeitador. Sua mãe havia morrido durante o seu parto e o pai vivia bêbado pelas ruas de União. Vez ou outra encontrávamos com ele e Juca sempre o tratou muito bem, apesar de não receber nenhum carinho da parte do pai.
Eu morava na rua do comércio, próximo à praça da matriz. Quando cheguei em casa, encontrei minha mãe conversando com dona Aura na porta. Dona Aura era uma velhinha, mas tão velhinha que Tiago dizia que ela havia ajudado Domingos Jorge Velho na destruição do quilombo dos Palmares. Ela ficava enfezada com isso.
- Tava onde, mocinho? - perguntou minha mãe.
- Tava no rio, mãe! - respondi.
- Percebe-se. Nem pense em entrar agora pra não molhar a casa. Fiquei aí secando, enquanto eu converso com dona Aura. - disse minha mãe.
- Dizem que ele corre bixo, Maria. Hoje é noite de lua cheia. Acho que hoje a noite ele vira. - disse dona Aura.
Fiquei curioso pra saber quem era, mas minha mãe ao perceber que eu escutava a conversa mudou logo de assunto.
- A senhora vai pra missa, hoje, dona Aura? - perguntou minha mãe tentando mudar de assunto.
- Vou sim, Maria. Hoje, Padre Clóvis disse que tem uma surpresa. - disse dona Aura.
- Surpresa? - perguntou minha mãe.
- Sim... ele somente disse que a nossa cidade vai entrar na rota do império. - disse dona Aura.
- Rota do Império??? - perguntou minha mãe.
Rota do Império? O que será que Padre Clóvis quis dizer isso?
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